quarta-feira, julho 23, 2008

MULHERES







O desrespeito à natureza tem afetado a sobrevivência de vários seres e
entre os mais ameaçados está a fêmea da espécie humana. Tenho apenas um
exemplar em casa, que mantenho com muito zelo e dedicação, mas na
verdade acredito que é ela quem me mantém. Portanto, por uma questão de
auto-sobrevivência, lanço a campanha 'Salvem as Mulheres!'.
Tomem aqui os meus parcos conhecimentos em fisiologia da feminilidade a
fim de que preservemos os raros e preciosos exemplares que ainda restam:

Habitat
- Mulher não pode ser mantida em cativeiro. Se for engaiolada, fugirá ou
morrerá por dentro. Não há corrente que as prenda e as que se submetem à
jaula perdem o seu DNA. Você jamais terá a posse de uma mulher, o que
vai prendê-la a você é uma linha frágil que precisa ser
reforçada diariamente.

Alimentação correta
- Ninguém vive de vento. Mulher vive de carinho.
Dê-lhe em abundância. É coisa de homem, sim, e se ela não receber de
você vai pegar de outro. Beijos matinais e um 'eu te amo' no café da
manhã as mantém viçosas e perfumadas durante todo o dia. Um abraço
diário é como a água para as samambaias. Não a deixe desidratar.

Flores também fazem parte de seu cardápio
- Mulher que não recebe flores murcha rapidamente e adquire traços
masculinos como rispidez e brutalidade. Pelo menos uma vez por mês é
necessário, senão obrigatório, servir um prato especial.
Respeite a natureza
- Você não suporta TPM? Case-se com um homem.
Mulheres menstruam, choram por nada, gostam de falar do próprio dia,
discutir a relação. Se quiser viver com uma mulher, prepare-se para
isso.

Não tolha a sua vaidade
- É da mulher hidratar as mechas, pintar as unhas, passar batom, gastar
o dia inteiro no salão de beleza, colecionar brincos, comprar sapatos,
ficar horas escolhendo roupas no shopping. Só não incentive muito estes
últimos pontos ou você criará um monstro consumista.

Cérebro feminino não é um mito
- Por insegurança, a maioria dos homens prefere não acreditar na
existência do cérebro feminino. Por isso, procuram aquelas que fingem
não possuí-lo (e algumas realmente o aposentaram!). Então, agüente mais
essa: mulher sem cérebro não é mulher, mas um mero objeto de decoração.
Se você se cansou de colecionar bibelôs, tente se relacionar com uma
mulher. Algumas vão lhe mostrar que têm mais massa cinzenta do que você.
Não fuja dessas, aprenda com elas e cresça. E não se preocupe, ao
contrário do que ocorre com os homens, a inteligência não funciona como
repelente para as mulheres.

Não confunda as subespécies
- Mãe é a mulher que amamentou você e o ajudou a se transformar em
adulto. Amante é a mulher que o transforma diariamente em homem. Cada
uma tem o seu período de atuação e determinado grau de influência ao
longo de sua vida. Trocar uma pela outra não só vai prejudicar você como
destruirá o que há de melhor em ambas.

Não faça sombra sobre ela
- Se você quiser ser um grande homem tenha uma mulher ao seu lado, nunca
atrás. Assim, quando ela brilhar,você vai pegar um bronzeado. Porém, se
ela estiver atrás, você vai levar um pé-na-bunda. Aceite: mulheres
também têm luz própria e não dependem de nós para brilhar. O homem sábio
alimenta os potenciais da parceira e os utiliza para motivar os
próprios. Ele sabe que, preservando e cultivando a muher, ele estará
salvando a si mesmo.

(Fábio Reynol)

segunda-feira, julho 21, 2008




As vezes em que eu mais te amei
tu o não soubeste
e nunca o saberias.
Sozinho a sós contigo
em mim mesmo eu te criava,
em mim te possuía
De onde vinhas nessas horas
em que inteira eu te envolvia,
nem eu mesmo o sei
e nunca o saberias
Contudo, em paz
eu recebia o carinho,
compungindo o recebia,
tranqüilo em meu silêncio
e tão tranqüilo e tão sozinho
que calmamente eu consentia:
- que ainda que muito me tardasse
mais ainda, um outro tanto, eu sempre esperaria.

(AFONSO ROMANO DE SANT'ANNA)

Devemos beber desta água suja



Mais uma vez Nelson Rodrigues surge para me orientar

O telefone preto tocou. Era o Nelson Rodrigues. Ele me liga de sua nuvem de algodão, num céu crivado de estrelas de purpurina. Nelson se manifesta sempre nas crises - minhas e do país.

- Nelson, que bom que você ligou... estava precisando. O Brasil está um labirinto de escândalos.

- Ora, rapaz, o país sempre foi assim. Só mudou uma coisa: antes, a consciência social dos brasileiros era medo da polícia; agora, eles perderam o medo... Eu sou do tempo do ladrão de galinha, quando só tinha três ou quatro bandidos no país... ah... bons tempos... O Zé da Ilha, o Mineirinho, até os apelidos eram mais doces... Havia uma vaga simpatia pelos vagabundos. Hoje não; quem faz sucesso são os ladrões de casaca... Eles entram na churrascaria e são olhados com admiração. "Olha lá o gatuno!" - o executivo diz, comendo uma picanha. E o outro responde, trêmulo de inveja: "É ladrão, mas dá nó em pingo d"água! Dizem que ele tem até Picassos na cozinha..." E as santas esposas suspiram ao lado, pensando nas jóias que ganhariam deles... E ainda se viram para o marido e lhe atiram na cara: "Você não é honesto não; você é burro!!".

Elas têm razão. Falta de caráter facilita a vida. Ninguém mais é honesto. A honestidade é uma úlcera que devora as entranhas como uma víbora do Butantã...

- Mas, não entendo... Nelson... os caras já têm bilhões. O Nahas já derrubou as bolsas, quebrou o mercado de prata no mundo! E querem mais?

- Rapaz, roubar é um vício secreto; no ladrão de galinha e nas grandes jogadas, vive-se a doce embriaguez da adrenalina, feito lança-perfume no Bola Preta.

- E os caras nem se escondem mais no suéter... saem de cabeça erguida...

- Claro! Ser preso faz parte do jogo. Quem ia conhecer seus feitos sem a prisão? Eles se orgulham. É um xeque-mate ao contrário, uma vitória ao avesso. A lei no país é um bálsamo. Eles se exibem feito Clark Gables, Gregory Pecks, com sorriso de pasta de dentes... se orgulham... No meu tempo, o canalha se escondia envergonhado pelos cantos ou então se ocultava atrás da "pose"... Ahhh... como era importante a "pose". A habilidade do grande ladrão era aparentar... Mesmo com um "jabá" ali, quentinho, no bolso, a pose era imprescindível.

O larápio antigo tinha perfil de medalha, sorrisos conciliatórios, oportunismo disfarçado de tolerância democrática. Havia a doce volúpia de prometer e não cumprir, de trair de cara limpa. Todos fingiam a tranqüila solidez de bons estadistas ou empresários.

O povo babava na gravata e berrava, dando rutilas patadas: "Digam o que disserem - ele rouba, mas faz". E faziam mesmo, quase nada, mas faziam. O povo deixava-se roubar, boquiaberto e devoto. Hoje, os viadutos morrem no ar, as placas de obras dormem no meio das caatingas. Antes, os rapineiros tinham um estranho amor pelo país que pilhavam... Sentiam-se no direito da "mão grande"... Eles se sentiam parte da tradição nacional, misturados com as florestas, com as cachoeiras... Havia uma simbiose consentida entre eles e o povo. Eles acreditavam que eram bons para o Brasil. Na mentira, o essencial é o auto-engano.

Ahhh, que saudades do Lupion, do Ademar, do buraco do Lume, tantos... Roubar era uma arte, rapaz...

- Hoje é um esporte?

- Rapaz, hoje o roubo é em girândolas (desculpe a frase) mas hoje não há autores, há cúmplices; todos são cúmplices. Antes, fulano roubava sicrano ou beltrano. Hoje, cada bandalheira se espalha como uma trepadeira de chuchus, é um jogo-da-velha com mil buracos, uma firma sai de dentro da outra, como cartola de mágico, cada ladrão tem sete cabeças, de sete cabeças saem outras sete e nunca se consegue matar a hidra. Ninguém entende nada. O povão treme dentro da própria boçalidade: afinal, quem roubou quem? Ninguém entende. O não entendimento faz parte da estratégia... Pois o próprio Lula não falou que "podem investigar, que o povo nem sabe o que é dossiê"? É um caso sério, rapaz...

- E como condenar alguém se todo mundo mente?

- Ninguém está mais faltando com a verdade... Isso é coisa antiga... O canalha de hoje não tem respeito nem pela mentira.

Antes, o sujeito roubava e fugia para o mato. Hoje, foge para o Congresso. Você viu os deputados do mensalão? Todos querem acabar com o "foro privilegiado" e cair na justiça comum, porque sabem que lá mora a liberdade dos infinitos habeas corpus...

Por exemplo, o grande erro daquele Cacciola foi fugir. Se ficasse aqui, não lhe aconteceria nada... Agora, vai ser caçado como uma ratazana grávida... pra servir de "exemplo".

Mas a grande novidade na gatunagem contemporânea é o ladrão com justa causa. Existem vigaristas que dizem, de peito enfunado e testa alta: "Eu roubo porque não vou deixar aí essa grana para pagar o FMI!"

E também temos os bandidos ideológicos: "Não é roubo não... - afirmam - trata-se de "desapropriação" dos capitalistas!".

Você viu outro dia a comemoração dos pelegos sindicalistas no Congresso, felizes, tudo de gravata, com uísque 30 anos, ameaçando jornalistas? A ideologia absolve e justifica os ratoneiros. "Não tem nada demais pegar mais 100 milhões por ano e não prestar contas ao TCU... - afirmam - trata-se da vitória dos sindicatos sobre os burgueses que exploram o povo, pois, como dizia Lênin: os fins justificam os meios..." É assim... Antigamente, o comuna verdadeiro, o legítimo, o escocês, tinha orgulho da própria miséria. Andava esmolambado pelos cantos, filando ponta de cigarro. Neste novo governo, surgiu o desfalque em nome de Marx... que aliás está uma fera com o PT aqui em cima...

- E que vai ser de nós, Nelson?

- Isso tudo é muito bom. Está se rompendo a úlcera do país, a apendicite supurada vai furar... O Código Penal já está desmoralizado, há juízes jovens e implacáveis, a PF parece SWAT de filme americano. É bom...

O Brasil está assumindo a própria lepra, a própria miséria moral. E essa coisa torta, mentirosa, vagabunda é a nossa verdade. Você não quer saber qual é a verdade? É isso.

Os brasileiros deviam se abaixar no meio-fio e beber desta água suja. Ela é a nossa salvação.

- Nelson... você sempre me traz esperança...

- Deus te abençoe...

(Arnaldo Jabor)

Declaração de amor

Tentei dizer quanto te amava, aquela vez, baixinho...
Mas havia um grande berreiro, um enorme burburinho
E, pensando bem, o berçário não era o melhor lugar.
Você de fraldas, uma graça, e eu pelado lado a lado,
Cada um recém-chegado,
você sem saber ouvir, eu sem saber falar...

Tentei de novo, lembro bem, na escola.
Um PS no bilhete pedindo cola,
Interceptado pela professora como um gavião...
Fui parar na sala da diretora e depois na rua,
Enquanto você, compreensivelmente, ficou na sua...

A vida é curta, longa é a paixão.

Numa festinha (ah, nossas festinhas...), disse tudo:
"Eu te adoro, te venero, na tua frente fico mudo"
E você não disse nada... E você não disse nada...
Só mais tarde, de ressaca, eu atinei:
Cheio de amor e "Cuba", me enganei
...e disse tudo para uma... Almofada!

Gravei, em vinte árvores, quarenta corações.
O teu nome, o meu, flechas e palpitações:
No mal-me-quer, bem-me-quer, dizimei jardins.
Resultado: sou persona pouco grata,
Corrido aos gritos de "Mata!! Mata !!"
Por conservacionistas, ecólogos e afins...

Recorri, em desespero, ao gesto obsoleto:
"Se não me segurarem, eu faço um soneto !"
E não é que fiz, e até com boas rimas ?!
Você não leu, e nem sequer ficou sabendo....
Continuo inédito e eu, por teu amor sofrendo...

Mas fui premiado num concurso em Minas.
Comecei a escrever com pincel e piche
Em muro branco; o asseio, que se lixe;
Todo o meu amor para a tua ciência!
Fui preso, aos socos, e fichado.
Dias e mais dias interrogado:
Era PC ... PC do B ou alguma dissidência ?

Te escrevi com lágrimas, sangue, suor e mel,
(você devia ver o estado do papel ! ...)
Uma carta longa, linda e passional.
De resposta, nem uma cartinha
Nem um cartão, nem uma linha!...
Vá se confiar no Correio Nacional !

Com uma serenata sim, uma serenata
Como nos tempos da Cabocla Ingrata
Me declararia, respeitando a métrica...
Ardor, tenor, a calçada enluarada...
Havia tudo sob a tua sacada.
Menos tomada para a guitarra elétrica !...

Decidi, então, botá a maior banca
No céu e escrever com fumaça branca:
"Te amo", assinado...e meu nome bem legível.
Já tinha avião, coragem, brevê,
Tudo para impressionar você !
Mas veio a crise: Faltou o combustível !...

Ontem, você me emprestou o seu ouvido
E na discoteca, em meio do alarido,
Despejei meu coração...
Falei da devoção há anos entalada
E você disse:" Eu não escuto nada !! "

Curta é a vida, longa é a paixão...

Na velhice, num asilo, lado a lado,
Em meio a um silêncio abençoado,
Eu lhe direi o que sinto, meu bem...
O meu único medo é que então ,
Empinando a orelha com a mão,
você me responda só: "Hein?"


(Luiz Fernando Veríssimo)

segunda-feira, julho 14, 2008

"FOSSÔMETRO"

O que o bafômetro não sabe
Nessa caça às bruxas que virou o caso dos motoristas embriagados, divulgou-se que as mulheres praticamente estão fora de perigo: por beberem menos, ou por serem mais obedientes à lei, parece que só uma, em todo o Estado, foi presa até agora. As mulheres bebem, e não é chazinho, mas temos a cabeça no lugar e não vamos nos arriscar. Álcool nunca foi motivo para cometermos barbaridades no trânsito. Quanto a isso, a Polícia Rodoviária pode ficar tranqüila. Agora, se virem uma mulher dirigindo em estado de profunda dor-de-cotovelo, detenham-na.

Eu tenho umas teorias estapafúrdias e essa é mais uma. Estou divulgando-a aqui na coluna para, dependendo do recall das leitoras, confirmar se ela é estapafúrdia mesmo ou se há nela alguma legitimidade. Trata-se do seguinte: o amor é que é nossa cachaça.

Tenho três exemplos pra contar, todos reais.

1. Eu a conhecia bem. Ela não havia bebido, eram 10 horas da manhã. Seu único problema é que estava embriagada de desgosto. Abissalmente triste. Garoava, um carro travou em frente ao dela e não houve tempo para frear: quando viu, já havia colidido. A cabeça estava em outro mundo, menos no trânsito. Chorou ali mesmo, no meio da rua. Chorou tudo o que estava represando há dias. Álibi perfeito.

2. Uma outra saiu muito irritada do prédio do namorado. Mas muito irritada. Eu a entendo. Homens têm essa capacidade congênita de tirar a gente do sério. Pois então: a louca saiu da garagem dele sem nem esperar o portão eletrônico abrir totalmente. Raspou todo o teto do carro e a antena ainda ficou de presente pra ele, torta, ali no chão. Ela nem se deu o trabalho de sair do carro e buscá-la, seguiu em frente cantando pneu. Foi a partilha de bens do casal. Ele ficou com a antena, e ela com um baita arranhão no carro e um machucado maior ainda por dentro.

3. A última. Havíamos nos encontrado por acaso na rua, sentamos para tomar um suco e ela me contou que não suportava mais uma determinada situação. Estava com ódio de si mesma por não conseguir dar fim ao seu tormento. Quando nos despedimos, perguntei se ela estava em condições de dirigir. Imagina! Estava na fossa, só isso. Ela me abraçou e prometeu dar notícias. E deu. Me contou que naquele mesmo dia, logo depois de nos despedirmos, ela fez uma ultrapassagem, digamos, mais dinâmica, e provocou um batidazinha. Coisa boba, mínima. "Mas eu não precisava mais essa".

Nenhuma lei vai nos pegar, já que felizmente não existe o teste do "fossômetro", mas mulheres que acabaram de ter uma séria discussão com o namorado ou o marido, não abusem. Melhor pegar um táxi. Não está provado por nenhuma estatística, mas um coração agredido também altera nossa conduta, também diminui nossos reflexos, também pode comprometer nossa perícia no trânsito. Ou seja, uma paixão mal correspondida é que nos torna perigosas.

(Martha Medeiros)